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QUANDO O OBJETO FAZ A MÁGICA — E NÃO O MÁGICO

Ando pensando sobre as novas formas de mágica, ou melhor, em como a mágica se modificou com o advento das redes sociais. Muito é falado sobre a mágica para vídeo e sua profundidade, ou falta dela. Não discordo que a “mágica de Instagram” é rasa em sua absurda maioria, mas proponho um pensamento acerca da sua estrutura, uma comparação com a comédia e a função comercial desse tipo de mágica que, a partir de agora, chamarei de prop magic.


O termo prop magic deriva da comédia, ou melhor, de um tipo específico de comédia, a prop comedy, que é um tipo de comédia a qual se utiliza de objetos para gerar o efeito cômico. Ironicamente, um dos maiores prop comics era o mágico Tommy Cooper. Utilizo o termo para descrever os vídeos os quais utilizam efeitos de mágica como núcleo do que é apresentado e tentam demonstrar, ou simular, assombro. Ainda existem os vídeos que utilizam a exposição do método para a câmera como forma de engajamento. Esses vídeos partem do princípio da exposição da beleza da lógica interna para angariar visualizações. Não é sobre esses vídeos que o texto trata.


A estrutura da prop magic pode ser observada em vídeos virais de mágica: um mágico, em uma festa ou situação cotidiana, aborda uma pessoa e faz uma sequência de números de mágica extremamente visuais, porém desconexos entre si, e tem-se a reação da pessoa como uma comprovação do efeito. Em termos de uma estrutura de apresentação, é extremamente fraco, pois, uma vez que se faz o uso contínuo de gimmicks e props, os efeitos surgem para o espectador como efeitos ligados diretamente ao objeto e não ao mágico, diminuindo não só a capacidade de se gerar assombro como também a participação do mágico na mágica — em resumo, um tiro no pé enquanto mágico, mas que gera visualizações.


Entre comediantes, os ditos prop comics por vezes são vistos com algum desdém por não se encaixarem dentro do purismo do stand-up comedy, ao se utilizarem de objetos para construírem suas punchlines. Em relação à mágica, penso que o prejuízo não esteja ligado a um rigor técnico, mas sim ao prejuízo que acontece em relação à percepção dos espectadores de mágica. Como existe uma abundância de efeitos diretamente ligados ao método, o espectador passa a imputar ao objeto a capacidade mágica e não ao executor, o que, por sua vez, diminui o assombro e acaba sendo, para a mágica, uma ação contraproducente. Temos que lembrar que a mágica vai além da simples execução do impossível.


Em termos comerciais, a prop magic é extremamente lucrativa e estimulada por parte de vendedores. Se, em um vídeo com cinco mágicas, se utilizam cada uma com um prop diferente, foram feitas cinco vendas. Então, essa exacerbação da mágica ligada ao efeito se mostra lucrativa para os produtores de efeitos mágicos.


Nem tudo são espinhos. A necessidade constante de uma renovação do repertório gera uma demanda para a produção de novos efeitos, por menores que sejam, e, consequentemente, abre-se a oportunidade para os mágicos criarem novos gimmicks e props limitados a um efeito, ao invés de sistemas e ferramentas de uso contínuo e amplo.

Podemos dizer que, comercialmente, a prop magic funciona bem. A questão maior aqui é se vale a pena termos um sucesso comercial em detrimento da qualidade artística do mágico e da mágica.

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